quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Conversa de esplanada

Estou na esplanada do costume. Aguardo por um amigo. Tenho um livro na mão, Contos de John Cheever II. Chega o amigo:
AMIGO: Sempre a ler, meu caro.
EU: Tem de ser, tenho que dar utilidade a tua falta de pontualidade.
AMIGO: O que é isso?
EU: John Cheever.
AMIGO: Deixa-me ver.
 Ele pega no livro, folheia-o e lê o posfácio de José Lima. 
AMIGO: Andas a ler um roto?
EU: Roto?!
AMIGO: Sim, estão aqui a dizer que ele é roto.
José Lima fez uma brilhante tradução. O livro é puro deleite literário, mas os posfácios que salientam a polémica que envolveu o escritor, sobre a sua alegada homossexualidade, são deprimentes. Quando leio Cheever até posso sentir a tessitura das emoções contraditórias, mas nunca me apercebi sobre a sua orientação sexual, e se existirem vestígios desta são residuais. Fiquei fascinado pela obsessão do escritor pela Itália e pela família. As personagens femininas são tímidas e correctas mas revelam conhecimento sobre o sexo oposto, e apreço. As descrições são envolventes, e as emoções descritas e evocadas são reveladoras de uma mente arguta mas sensível, mas não devo isso a uma suposta ou efectiva homossexualidade. Enfim, é um bom livro, não deveria ter conotações pífias.